Saúde

Estado de emergência no Japão: entenda o que acontece na prática

O Japão pode declarar Estado de Emergência a qualquer momento, em resposta ao aumento das infecções por coronavírus. Mas as restrições aos indivíduos não serão obrigatórias devido ao que diz a constituição.

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Desbravando o Japão

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Até o momento, com cerca de 3.506 casos e 77 mortes, o Japão vem sendo poupado de uma explosão de casos de coronavírus tal como tem ocorrido em muitos países da Europa e nos Estados Unidos. Contudo, inúmeras autoridades japonesas consideram que um aumento explosivo de casos no país é questão de tempo, caso medidas mais duras não sejam tomadas.

Em todo o mundo o número de casos já passa de 1 milhão e 200 mil, enquanto as mortes superaram 64.000. Neste cenário abalado pelo covid-19, a comunidade brasileira no Japão já ficou na dúvida entre ficar no Japão ou ir embora ao Brasil. Se o número de casos no Japão continuar aumentando, o país terá que começar a lidar com questões difíceis sobre a alocação de recursos médicos limitados. É o que está sendo visto na Itália e na Espanha, cujos sistemas médicos praticamente entraram em colapso, pressionando os médicos a priorizar o tratamento de pessoas com maior chance de sobreviver.

Shinzo Abe, o primeiro-ministro do Japão, continua tratando com bastante cautela o que muitos oficiais do governo consideram ser um último recurso para a situação: declarar o Estado Nacional de Emergência. Apesar do rápido e alarmante aumento no número de infecções por coronavírus em áreas urbanas como Tóquio e Osaka, além dos apelos dos especialistas médicos que estão preocupados com o colapso do sistema de saúde, o primeiro-ministro ainda hesita.

FONTE: worldometers. Para mais dados clique AQUI

Hoje, dia 5 de abril, domingo, 143 pessoas foram infectadas com o novo coronavírus em Tóquio. No último sábado, dia 4 de abril, cerca de 118 novos casos foram registrados; esta foi a primeira vez que o número de casos confirmados por dia passou de 100 na capital, e com os números de hoje, o número total de casos confirmados na cidade subiu para 1034. Ao mesmo tempo, em Osaka, foram 41 novos infectados no sábado.

O governador de Osaka, Herofumi Yoshimura, é uma das autoridades que pressiona o primeiro-ministro a declarar estado de emergência. Ele já preparou medidas a serem tomadas para se antecipar à medida. Seguindo seu exemplo, na última sexta-feira a governadora de Tóquio, Yuriko Koike, afirmou que a declaração enviaria uma mensagem forte que poderia ajudar a evitar a explosão de um surto da doença. Além disso, a governadora defende que pessoas e empresas precisam saber com antecedência o que o governo metropolitano pretende fazer para que possam tomar providências.

Por que motivo o Estado de Emergência ainda não foi declarado no Japão?

Em teoria, o primeiro-ministro pode colocar o país em estado de emergência por um período de até dois anos a partir da data da aprovação do projeto de lei que permite faze-lo, mas isso tem o potencial de causar alterações profundas na maneira como funciona sociedade japonesa.

Foto por 内閣官房内閣広報室 | Link

Em meio ao crescente clamor pela adoção de restrições mais rígidas a movimentação das pessoas com o objetivo de conter a maré de infecções, o governo até agora tem se preocupado com os fortes danos que o estado de emergência poderia causar numa economia que, mesmo sendo a terceira maior do mundo, encontra-se muito perto da recessão. O primeiro-ministro parece estar considerando a relação entre a necessidade de declarar um estado de emergência e as suas possíveis consequências para a vida dos japoneses e a economia.

Enquanto o governo se prepara para lançar um plano de estímulo econômico na próxima semana, Shinzo Abe pede o fechamento de escolas e convoca os cidadãos a evitarem reuniões e saídas desnecessárias ou que não sejam urgentes. “Se necessário, não hesitarei em declarar um estado de emergência”, disse Abe em uma sessão parlamentar na sexta-feira, mas ao mesmo tempo afirmou que ainda não acredita que as infecções tenham se espalhado o suficiente por todo o país. Para ele, o Japão está conseguindo segurar a propagação do vírus, e enquanto as pessoas permanecerem vigilantes, o estado de emergência poderá ser evitado.

Filial do Starbucks no Japão removendo a maior parte de seus móveis para encorajar o distanciamento físico durante a pandemia de COVID19. Foto por Mccunicano | Link

Mas, na prática, o que acontece num Estado de Emergência?

Um estado de emergência permitiria que os governadores das prefeituras solicitassem que os residentes ficassem em casa e limitassem o uso de escolas e outras instalações para conter infecções, mesmo que não possam forçar as pessoas a fazê-lo. Entretanto, os governadores podem usar terras e instalações sem a permissão de seus proprietários para fornecer atendimento médico de emergência, desde que haja uma necessidade legítima e comprovada de fazê-lo. Os governadores das províncias também podem exigir que medicamentos, alimentos e demais artigos de primeira necessidade sejam vendidos ou entregues.

De acordo com as leis atuais japonesas, certos pré-requisitos devem ser atendidos para que o governo faça uma declaração tão drástica: relatórios domésticos de pacientes; uma séria ameaça à saúde, vida e economia das pessoas; e dificuldade de conter a infecção por outros meios legais. Se eles foram ou não cumpridos, ainda é uma questão de disputa.

É muito improvável que o governo japonês institua um estado policial draconiano nos moldes do que foi visto em Wuhan, na China. Até as rigorosas medidas de contenção da Itália, onde os casos de coronavírus irromperam exponencialmente, foram questionados por testar os limites da democracia; o governo italiano ameaçou prender ou multar pessoas por se deslocarem entre certas partes do país.

Quais os limites para as ações do governo durante o Estado de Emergência?

Existem preocupações de que a declaração de um Estado de Emergência permita ao primeiro-ministro Shinzo Abe e ao governo central usarem poderes amplos e restritivos. Numa entrevista coletiva, um repórter chegou a questionar Abe sobre a possibilidade de que a declaração pudesse ser usada como um trampolim para mais controles extremos que poderiam até mesmo limitar a liberdade de expressão.

Durante a vigência do estado de emergência, porém, a autoridade do governo central é relativamente limitada. De fato, ele não possui um mecanismo de execução que permita a aplicação de punições legais mais severas. Pelo contrário, ao invés de centralizar, coloca grande parte dos poderes de execução das medidas de emergência nas mãos dos governadores e prefeitos. Quando comparado à declaração de estado de emergência em outros países, a versão japonesa é uma exceção, pois o poder real é entregue aos governos locais.

Enquanto não declara o Estado de Emergência, o que o governo japonês tem feito em relação à pandemia?

De início, o governo japonês comprometeu 15,3 trilhões de ienes para tentar aliviar o impacto econômico do COVID-19, e já planejava introduzir outro pacote de financiamento de emergência. Na época, o Ministério da Saúde também revelou a possibilidade de destinar um subsídio para ajudar as empresas a continuarem pagando seus trabalhadores.

Agora o governo de Abe planeja anunciar um pacote de estímulo já na próxima semana, com doações em dinheiro para famílias em dificuldade e apoio a pequenas e médias empresas como características-chave do que provavelmente será uma medida de gasto ainda maior do que o pacote de 56,8 trilhões de ienes (525 bilhões de dólares) reunidos durante a crise financeira global de 2008.

Na última sexta-feira, o primeiro-ministro e seu Partido Liberal Democrata concordaram que o governo fornecerá 300.000 ienes (cerca de 2.800 dólares) em dinheiro para cada família que sofre com a queda de renda em meio à disseminação do novo coronavírus. Cerca de 10 milhões entre os 58 milhões de lares japoneses sejam elegíveis para receber esta ajuda.

Ainda não está claro se o primeiro-ministro Abe e o governo realmente declararão Estado de Emergência. Mas as contra medidas continuam aumentando, incluindo restrições de viagem, que exigem que visitantes da China e da Coréia do Sul fiquem em quarentena. Um funcionário da Organização Mundial da Saúde pediu a todos os países que ajam agora para conter os surtos e não esperem que chegue a “um fim natural”.

N27 - 12-03-2020
Foto: Escritório do Primeiro Ministro do Japão/Fotos Publicas
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