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Por que frutas e vegetais no Japão são tão caros?

É incrível como nos surpreendemos com os preços das frutas e vegetais durante as compras. Veja a explicação desse dilema”

Por que frutas e vegetais no Japão são tão caros?
Desbravando o Japão

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O preço das frutas e vegetais frescos no Japão é um verdadeiro choque. No caso das frutas, é comum ouvir as pessoas dizerem que isso ocorre porque o cultivo de cada fruta é muito cuidadoso. Histórias comoventes de produtores de cereja que poliam à mão cada um dos frutos e consumidores apreciando sua carne branca e cremosa são regularmente contadas para justificar o preço exorbitante da fruta produzida internamente.

Mas o que dizer de produtos do dia a dia, como batatas, cenouras e tomates? Por exemplo: um pequeno saco de batatas, cultivado em Nagasaki, custa 297 ienes, sem impostos. Duas cenouras, cultivadas em Chiba, custam 197 ienes, e os tomates, também de Chiba, custam 117 ienes cada.

Não sei sobre o preço dos vegetais em países vizinhos como China ou Coreia do Sul, mas no Reino Unido, outra pequena nação insular com poucos agricultores e uma população predominantemente urbana, os preços são menos da metade daqueles praticados no Japão, sem mencionar os preços do Brasil, é claro.

Em 2016, o valor dos vegetais produzidos internamente no Japão foi estimado em 22,9 bilhões de dólares. Compare isso com o valor dos vegetais produzidos internamente no Reino Unido – 1,89 bilhões em 2017 – e você pode ver que, mesmo levando em consideração o fato de que a população do Japão é cerca de duas vezes maior que a do Reino Unido, os agricultores japoneses são vencedores.

Por que a discrepância de preços? Até certo ponto, a culpa é dos clientes exigentes. Quando os fazendeiros japoneses estão preparando suas safras para a venda, eles sabem que apenas os itens mais bonitos serão aceitos nos supermercados. Uma batata deformada ou um tomate levemente descolorido serão comidos pela família do fazendeiro ou jogados fora. Além de ser um desperdício, isso torna os vegetais mais valiosos do que deveriam, portanto, mais caros.

Outro fator a se ter em mente é que o Japão não possui muitas terras agrícolas. Apenas 12% da terra é usada para o cultivo e a maior parte dela é usada para a produção de arroz. O fator mais importante, entretanto, é que as fazendas japonesas são muito menores do que as de outros países. De acordo com estatísticas do governo, o tamanho médio de uma fazenda japonesa é de apenas 1,9 hectares, em comparação com 198 hectares nos Estados Unidos. As pequenas propriedades são menos eficientes do que as grandes, e os pequenos agricultores têm menos dinheiro disponível para investir no maquinário necessário para reduzir os custos.

Ironicamente, a predominância de pequenas fazendas é atribuída aos americanos. Após a Segunda Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos ocupou o Japão por sete anos. Durante esse tempo, várias medidas radicais foram tomadas para desmantelar o que eles viam como impedimentos estruturais à criação de uma sociedade democrática. Um deles foi um programa de reforma agrária que viu as grandes e antigas propriedades feudais serem quebradas e distribuídas para milhões de pequenos agricultores. Até hoje, a lei japonesa estipula que todas as terras agrícolas devem ser trabalhadas diretamente por seu proprietário. Isso pode tornar o Japão uma sociedade mais justa, mas também torna sua agricultura muito menos eficiente e seus produtos agrícolas mais caros.

No entanto, tanto os agricultores como o Partido Liberal Democrático (LDP), que está no poder, gostam das coisas assim. Embora a agricultura represente pouco mais de um por cento do PIB do Japão e os agricultores representem apenas 3,4% da população, mapas eleitorais desatualizados e uma organização eficaz dos agricultores dão às comunidades rurais do Japão um poder político desproporcional. Os pequenos agricultores têm sido partidários ferrenhos do LDP desde que o partido no poder foi criado em 1955 e o lobby dos agricultores é um dos mais poderosos do Japão.

Mais surpreendentemente, os compradores também gostam do status quo. De acordo com uma pesquisa do Yomiuri Shimbun realizada em 2011, 80% dos eleitores acham que o governo deveria subsidiar as pessoas que se dedicam à agricultura pela primeira vez. Os compradores apoiam a agricultura subsidiada porque são encorajados a acreditar que os produtos agrícolas do Japão são os melhores do mundo e que essa qualidade tem um preço.

A preferência por vegetais produzidos localmente em relação aos importados é forte entre os consumidores japoneses. A mesma pesquisa do Yomiuri descobriu que enquanto 46% dos compradores acreditam que os produtos agrícolas estrangeiros são mais baratos do que os japoneses, 76% também acreditam que não são seguros.

Esse desprezo pelos produtos agrícolas estrangeiros garante que uma nação de consumidores urbanos experientes seja regularmente expulsa do supermercado. Ou, visto de outra forma, que o modo de vida rural no cerne da cultura tradicional japonesa é sustentado por habitantes urbanos felizes em pagar por suas batatas, cenouras e tomates.

Seja como for, a agricultura japonesa é uma proposta insustentável. Como acontece com tantas coisas no Japão, a demografia é a culpada. A idade média de um agricultor japonês é de 65 anos e está aumentando. Sem ninguém disposto a assumir o controle de suas fazendas quando morrerem, a agricultura japonesa logo chegará a um ponto crítico. Em 1961, o país produzia 78% de todos os alimentos que consumia. Em 2006, esse número caiu para 39%. Ele cairá muito mais no futuro e, ao cair, os compradores do Japão começarão a pagar muito menos por seus mantimentos – gostem ou não.

O fator clima

É fato que, quando o clima muda, surgem uma série de problemas para os agricultores, em qualquer lugar do mundo. Longas chuvas e a falta de sol do final do mês de julho, fez com que o preço do alface aumentasse cinco vezes em apenas duas semanas, incomodando produtores e consumidores.

De acordo com a Nagano, a Chojirushi, distribuidora de produtos no centro do Japão, o preço de atacado do alface havia caído para cerca de 60 ienes por quilo no início de junho, parcialmente devido à diminuição da demanda como resultado do novo surto de coronavírus. Mas por causa das más condições climáticas a partir do final de junho, o preço da alface subiu para 300 ienes por quilo em meados de julho.

Além disso, no início da primavera os estagiários estrangeiros do Programa de Treinamento Técnico de Estagiários do governo, chegam ao Japão e ajudam na colheita. Neste ano eles não puderam fazê-lo, devido à pandemia, sendo este mais um agravante no aumento repentino dos preços em julho. “Recebemos um golpe duplo”, disse um agricultor local.

Outro fator climático que tem peso no preço das frutas e vegetais são os tufões. Por exemplo, em 2016, as plantações de batatas de Hokkaido, ao norte do país, foram arrasadas, levando o preço das batatas às alturas, além da falta de salgadinhos da Calbee e Koikeya.