Tchê, eu sou um jovem de 36 anos (no momento em que escrevo esse post) e ainda que estejamos em pleno século XXI, muita gente ainda me critica usando a seguinte frase: “Mas tu ainda assiste desenho?”
Bah, é de cair os butiá dos bolso! Nesse pequeno artigo, quero trazer uma reflexão sobre as diferenças entre animação ocidental e anime tradicional japonês. Pra começar, desenho animado (animação ocidental) e anime não são a mesma coisa – confuso? Não te preocupa, ao final do artigo a coisa vai estar mais simples nessa tua cabecinha de segurar boné de firma!
Honestamente, não creio que anime e animação sejam tão diferentes, mas também não ouso dizer que são a mesma coisa. Aliás, tu talvez nem imagine, mas um se alimenta e se inspira no outro há anos! O que eu percebo de diferença principal é a mensagem que cada um deles leva ao seu público, isso sim é diferente, e diferente de uma forma bem interessante, me acompanha no raciocínio.
Mesma coisa, mas diferente
Os grandes estúdios de anime, como o estúdio Ghibli por exemplo (não dá pra falar de anime sem falar do Miyazaki-sama né?) expressam em suas obras uma grande reverência, admiração e respeito pela natureza – em parte devido ao background xintoísta dos países asiáticos – , onde a luta por ela significa mais que auto-preservação, mas a preservação coletiva é uma forma mais pura de expressar heroísmo e senso de justiça.
Outro aspecto muito explorado pelos estúdios de anime é a opressão social, onde um grupo de pessoas/seres (nem sempre humanos) – geralmente o governo – enfrenta uma geração obstinada e determinada a mudar as coisas.
Em contraste com as animações ocidentais, onde o tema é algo como “olha esse morcegão, que irado…” ou “eu era um zé ninguém, mas fui mordido por uma aranha radioativa e agora posso me grudar na parede…”
Não estou dizendo que as animações ocidentais não trazem temas importantes como o bem da natureza ou o combate à opressão social, Capitão Planeta ou Os X-Man me dariam uma tunda se eu dissesse isso.
Porém o individualismo ainda está bastante presente, mesmo nesses casos, a luta é contra uma corporação mal-intencionada, ou contra um vilão demoníaco.
Claro que personagens antagonistas como Lady Eboshi, de Princesa Mononoke, também passam a ideia de individualismo, mas… é diferente, Lady Eboshi está tentando sobreviver devido às circunstâncias, mas o inimigo é todo o sistema corrupto de IronTown.
Em comparação, existe nas animações ocidentais essa idéia de que a corrupção é algo que vem dos indivíduos, e não de sistemas. Além disso, enquanto nas animações ocidentais os heróis estão tentando salvar a natureza em benefício da humanidade, nos animes japoneses a natureza é uma entidade e precisa ser salva por seu próprio bem, pois é um ser vivo, que merece respeito.
Enquanto no caso ocidental o Capitão Planeta é a Natureza personificada, com quem os humanos podem interagir e até mesmo discutir, em Princesa Mononoke e Nausicaa do Vale do Vento os verdadeiros espíritos da natureza são intangíveis, são algo muito maior, com os quais um mero humano não pode conversar, e além disso, eles são ao mesmo tempo aterrorizantes e poderosos, mas também belos e encantadores.
A religião dominante e seus efeitos na cultura pop
A epistemologia ocidental, fortemente enraizada no cristianismo, que prega que o homem tem domínio sobre os peixes no mar, as aves nos céus e as criaturas sobre a terra, leva a uma visão utilitária e separada da natureza, e isso se reflete nas animações, reforçando assim desde tenra idade a noção de que somos superiores e separados da natureza, quando na verdade a mensagem que deveríamos passar é que somos todos um único sistema, somos interdependentes, a natureza também é uma entidade viva, digna de respeito e proteção.
Já o xintoísmo japonês enfatiza muito mais essa unidade, essa ideia de que somos todos parte de um grande organismo vivo, somos parte da natureza e ela é parte de nós. A natureza é a divindade suprema e nela nada é maior ou mais importante que outra coisa e assim, se torna digna de proteção e respeito, não porque a entendemos, mas justamente porque não entendemos, mas sabemos que somos parte dela.
“É um erro pensar na natureza a partir da ideia de eficiência, que as florestas devem ser preservadas porque são essenciais para os seres humanos.”
Hayao Miyazaki
Eu não quero de forma alguma ser o chato que menospreza as animações ocidentais, pelo contrário, eu adoro muitas delas e ressalto sempre as coisas boas que elas ensinam às nossas crianças (e a nós adultos também). A empatia e o respeito às diferenças que é ensinado em Toy Story, o amor-próprio e a auto-empatia enfatizados em Divertida Mente e tantas outras.
No entanto, creio piamente que os grandes estúdios ocidentais poderiam aprender com os grandes estúdios orientais um pouco mais sobre como afastar o exagero cômico e trazer um pouco mais de amor ao planeta, colocar mais medo no que tange a entidade natureza e focar mais na unidade que temos com ela, diminuindo a separação e aumentando a empatia de nossas crianças para com todas as formas de vida.
E é isso Tchê, espero que tu tenhas gostado da leitura. Deixa teu comentário sobre o assunto, vamos bater um papo!
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